Eu já vi algumas das pessoas que mais amo indo embora. Quando nem tinha idade para entender o que a morte significava, vi meu avô simplesmente desaparecer da minha vida. Perdi na minha mente a sua imagem nítida, ficaram apenas alguns detalhes, como os dedos dos pés cruzados que eu tentava em vão descruzar. Ficou na minha memória o seu gosto e prazer por fotografias, sempre de gravata, pois como ele dizia “é assim que um homem deve se vestir”. Quando aprendi que a morte era a perda permanente, a ausência constante, vi meu pai indo embora. Apesar de acreditar que isso não aconteceria nunca, pois ele havia prometido, eu o vi ir, sem despedidas. Ficou a mágoa, o rancor, a dor e a revolta de uma criança que a recém aprendia a entender a vida. Anos depois o perdoei. Anos depois me perdoei. Na adolescência, vi um amigo ceifar a própria vida, aprendi que coisas banais, também levam pessoas que amamos. E mais ainda, aprendi que a imagem, que a máscara que colocamos muitas vezes está tão bem colocada que esconde a realidade dos sentimentos.
Eu mesma vi a morte de perto. Duas vezes. Uma pela necessidade absurda e banal de querer chamar atenção, de ser notada, de me fazer ver. Outra, quando aprendi que a vida valia a pena. Numa dessas brincadeiras que o destino prega na gente. Uma prova. A prova dos nove.
A vida escorre por nossa vida sem nos darmos conta. Apesar de hoje acreditar que o fim não é o fim, apenas um recomeço, nunca irei me acostumar com a idéia da morte. Ainda acho que minha mãe será eterna. Ainda penso que ela sempre estará aqui, até depois de mim. Desejo pra meu filho vida longa. Eterna. Do tempo suficiente pra fazer tudo que quer. Alias, crianças não deveriam nunca correr risco de vida.
Mas correm, um risco banal. Porque no fundo toda morte é banal. Algumas mais que as outras. Hoje pela manhã, minha afilhada, uma menina, onze anos, a viu perto. E eu tive medo. Medo que não desse tempo. E me bateu o desespero de pensar que a vida é frágil, um detalhe. Apenas isso. Agora esta tudo bem. Mas o medo, o mal estar, ainda esta aqui. E acho que esse nunca mais vai embora. Porque no fundo é tudo banal. É tudo detalhe. E a gente tem que cuidar de cada detalhe. Sempre. Não estou preparada para ver mais ninguém partindo.
** Minha afilhada hoje, quase morreu. Fiquei sabendo agora. Idiotice. Foi tomar banho, fechou o banheiro, ligou o junker (aqueçedor a gás). Quarenta minutos de banho, faltou oxigênio. Passou mal. Tentou sair e desmaiou entre a pia e a porta. Ninguém conseguia abrir. Quase não volta. Desespero. Ambulância. Hospital. Esta tudo bem. Ela esta bem. Menos eu. Nada bem.
3 comentários:
Não estamos e creio que nunca seremos preparados para a morte... É algo inevitável, mas não aprenderemos a lidar com isso, nem passando pela experiência diversas vezes... E tomara que não sejam muitas!
Bjitos!
Demorei um pouco a ver a morte de perto. Na verdade, vi pessoas importantes para aqueles que eram importantes para mim irem embora primeiro. Nunca tive muito medo. Não sei porque. Isso não me assusta muito.
Quase nunca olho para os dois lados antes de atravessar a rua. Minha amigas acham que sou desmiolada, mas não é isso. É que morte, para mim, é algo realmente físico. Morte de alma eu já enfrentei. Já vi gente que amava muito deixar de viver em vida. Já vi eu mesma quase fazer isso (aliás eu fiz, por um tempo, mas a "equipe médica" era muito boa e não me deixou ir). Ano passado, vi meu pai com câncer. De novo, não tive medo. Ou se tive não deixei ninguém perceber. O que mais me assustava era como ele foi perdendo a alegria. Aliás, na morte, o pior é a dor que provoca
provoca antes de acontecer. Assim como o melhor do sexo pode ser o pré-orgasmo, pois depois dele é pausa. A dor antes da morte é mais cruel que ela em si, afinal...assim que passa ou vem a vida ou o descanso.Mas antes disso é medo, aflição e contestação da fé.
Beijos Menina. Fique bem. Vc e a menina. Estarei orando por vc.
Existem dias que servem para nos alertar para a fragilidade da vida.
O medo de perder quem amamos nunca deixará de existir, e jamais será suficiente para as impedir de nos deixar (mesmo contra a nossa vontade).
Durante toda a minha vida tive medo de perder a minha mãe, e num dia normal, como tantos outros, ela morreu à minha frente, sem culpa, ou nada que o fizesse prever.
Assim, passei a ter certezas de que a vida é realmente um mero detalhe, que perdemos demasiado tempo e gastamos energias com coisas que não importam, quando deveríamos, simplesmente, viver o dia de hoje ao máximo, e aproveitar bem a presença dos que nos importam.
O Amanhã... é sempre uma incógnita.
Beijo.
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